A ciência ocidental não explica tudo. Para a educadora Maria Betânia B. Albuquerque, da UEPA, e a antropóloga Isabel Santana de Rose, da UFAL, ao questionar a pretensa universalidade do saber científico atual, é possível se abrir para os conhecimentos tradicionais, que escapam do cartesianismo bruto e priorizam a sutileza dos mistérios.
“Para definir o que são os conhecimentos tradicionais, é preciso, além de questionar a ideia universal de ciência, questionar também a ideia de que a ciência contemporânea seria superior, ou mesmo mais eficaz, do que outros sistemas de conhecimento. Enquanto o conhecimento científico pretende a universalidade, os saberes tradicionais são múltiplos por definição”, pontuou Isabel de Rose, na quarta edição dos Encontros Psicodélicos. “Também é preciso se afastar de uma visão rígida, estática e essencialista sobre os conhecimentos tradicionais (...). O senso comum ainda prega essa visão do conhecimento tradicional como um conjunto fechado, que deve ser preservado numa visão meio museológica. Com isso, surge uma série de tendências, como a homogeneização, romantização, exotização, colonização, descontextualização e instrumentalização.”
Nesse sentido, o sociólogo Pietro C. Benedito, que mediou a conversa, lembrou da preferência de muitos pesquisadores por manter essa visão museológica, uma vez que é mais fácil falar sobre conjuntos extintos de saberes, os quais não têm como serem rebatidos.
A pesquisa voltada à pedagogia da floresta, de Maria Betânia B. Albuquerque, mostra que ensinamentos do tipo continuam muito vivos em tradições ayahuasqueiras, como o Santo Daime. “No meu doutoramento, procurei saber se o Daime é um professor, como dizem, e o que as pessoas aprendem com esse professor, que é um vegetal. Procurei traçar um mapa desses saberes da ayahuasca, tentando compreender qual é a episteme que fundamenta esses saberes”, afirmou a educadora, ressaltando o caráter transcendental em que os ensinamentos ocorrem. “A sociedade tem dificuldade de entender que é possível aprender a partir de uma planta, a partir de um outro estado de consciência, dos sonhos ou da intuição.”
O debate fez parte da série “Encontros Psicodélicos: conversas interdisciplinares sobre ayahuasca e outros psicoativos", uma cooperação mensal entre o portal Ciência Psicodélica (CP); o projeto Healing Encounters, do CNRS (Centro Nacional de Pesquisa Científica), em Paris; e o Grupo de Pesquisa ICARO (Cooperação Interdisciplinar para Pesquisa e Divulgação da Ayahuasca), da Unicamp; com apoio do Instituto Chacruna.
A edição “Diálogos de saberes: antropologia, educação, plantas e além” contou ainda com apresentação do biólogo Luis Felipe S. Valêncio, doutorando em Saúde Coletiva.
Assista o evento na íntegra:
Por Nathan Fernandes, Jornalista.
Comentários